Os logradouros, as desvalorizações da parte sobrante e as expropriações por utilidade pública

As opiniões produzidas neste espaço responsabilizam apenas o seu autor e correspondem à livre afirmação de um direito, devidamente legitimado, que é o direito à livre expressão.

É, então, normal que venham a surgir criticas, por vezes veementes, ao que é escrito. Todas as criticas, todas mesmo, serão bem vindas e publicadas neste espaço.

Este introito surge porque às vezes não conseguimos calar a nossa insatisfação quanto a situações que emergem no nosso exercício profissional de assessorarmos entidades particulares em peritagens de tribunais.

Generalizando, o caso é o seguinte:

“Um estabelecimento comercial (da área da restauração, hotelaria e diversão noturna) está implantado num terreno cujo parque de estacionamento vai ser expropriado em 50% da sua área para atravessamento de uma estrada”.

A entidade expropriante e alguns peritos da lista oficial de peritos de Tribunal alegam o que queremos polemizar:

- O valor do terreno é depreciado em 40% porque o que está a ser expropriado serve de logradouro e a capacidade edificativa já estaria toda ocupada;
- O facto do estacionamento ficar diminuído em 50% não deprecia a parte sobrante.

Refutamos:
- Quando adquirimos um terreno, seja até para habitação própria e permanente, nunca dizemos ao vendedor “Olhe, esta parte do terreno pago a X €/m2 e esta parte, porque vai servir de jardim e vou esgotar a capacidade edificativa na outra parte, pago a X-Y €/m2”.
O valor de um terreno é, simplesmente, Z €, que correspondem X €/m2 x área do terreno m2.
Mesmo a existência de zonas “non aedificandi” em logradouros não é em si mesmo razão para depreciação de terrenos;

- Não pode ser feita tábua rasa ao artigo 29º do Código das Expropriações (Cálculo do valor nas expropriações parciais), nomeadamente quando afirma “Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou às subsistentes , especificam-se também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada”.
Não é claro que a supressão de cerca de metade dos lugares de estacionamento disponíveis conduzirá à diminuição do movimento ou afluência de clientes à discoteca em causa?
Não é claro que os prejuízos causados à parte sobrante devem acrescentar ao valor da parte expropriada?

A nossa preocupação é ainda maior porque achamos que existe uma inércia muito grande dos intervenientes dos processos de expropriação em pensar de uma forma não formatada e pouco flexível.

Não podemos deixar de trazer estes assuntos à discussão porque é o interesse de muita gente sem recursos que é prejudicado.



  


2 comentários:

  1. E se amanhã demolir-se o edifício existente? O terreno perdeu ou não capacidade construtiva? Qual a desvalorização do terreno?

    Francisco Espregueira, MRICS

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  2. Interessante o tema, recorrentemente abordado em expropriações por DUP em zonas urbanas, quase sempre de forma pouco pacífica.

    Creio que a questão colocada a discussão engloba na realidade duas questões, porventura interligadas, mas cuja separação é fundamental para a sua correta resolução:
    - Eventuais prejuízos indiretos na atividade económica existente no prédio objeto de expropriação parcial (pela diminuição da capacidade do estacionamento);
    - Eventual desvalorização da parte não expropriada em termos fundiários (esta sim bastante mais polémica).

    Deixo aqui um reparo: a postura de um Perito Avaliador deve sempre neutra. Baseada na medida do possível em critérios técnicos objetivos e quantificáveis. Ver o expropriado como um "espoliado", ou a expropriante como "omnipotente", formata o avaliador distorcendo irremediavelmente a sua objetividade.

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