Por favor não subvertam o Acórdão n.º 6/2011 do Supremo Tribunal de Justiça!

(Além de que o Acórdão n.º 641/2013 de 11 de novembro do Tribunal Constitucional também é muito importante)

As indemnizações de expropriações por utilidade pública são sempre processos complexos. Esta complexidade acentua-se quando estão envolvidas expropriações de terrenos integrados em Reserva Agrícola Nacional.



A primeira dificuldade surge com a classificação do tipo de solo. De facto, a  caracterização do solo como “Solo apto para construção” ou “Solo apto para outros fins” pode ser determinante para a estimativa do valor da indemnização.

Estão claramente definidos no n.º 2 e n.º 3 do artigo 25º do Código das Expropriações os critérios de classificação dos solos:

Artigo 25.º
Classificação dos solos
(…)
2 — Considera -se solo apto para a construção:
a) O que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia elétrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir;
b) O que apenas dispõe de parte das infra–estruturas referidas na alínea anterior mas se integra em núcleo urbano existente;
c) O que está destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a adquirir as características descritas na alínea a);
d) O que, não estando abrangido pelo disposto nas alíneas anteriores, possui, todavia, alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da declaração de utilidade pública, desde que o processo respetivo se tenha iniciado antes da data da notificação a que se refere o n.º 5 do artigo 10.º
3 — Considera -se solo para outros fins o que não se encontra em qualquer das situações previstas no número anterior.

Ultrapassada esta questão, presumindo-se o solo inscrito em RAN como solo para construção, coloca-se a questão de determinar se a indemnização deve ser realizada considerando capacidade edificativa. Também aqui o Código das Expropriações é muito claro, no seu n.º 12 do artigo 26º:

Artigo 26.º
Cálculo do valor do solo apto para a construção
(…)
12 — Sendo necessário expropriar solos classificados como zona verde, de lazer ou para instalação de infraestruturas e equipamentos públicos por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada.

A razão do título deste artigo?

O facto de muitos peritos das entidades expropriantes (e, também dizê-lo, alguns peritos da lista oficial), só lerem cento e duas palavras de um acórdão com doze páginas: “Os terrenos integrados, seja em Reserva Agrícola Nacional (RAN), seja em Reserva Ecológica Nacional (REN), por força do regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como «solo apto para construção », nos termos do artigo 25.º, n.os 1, alínea a), e 2, do Código das Expropriações, aprovado pelo artigo 1.º da Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, ainda que preencham os requisitos previstos naquele n.º 2.”.

Recordamos aqui algumas passagens do Acórdão n.º 6/2011 que têm sido frequentemente negligenciadas, e em claro prejuízo da parte expropriada:

“Tem, assim, inteira razão a recorrida, quando advoga que «a indemnização por expropriação só será justa se repuser o princípio de igualdade, através da reconstituição da situação patrimonial que os expropriados detinham. Ora isto significa que, se o terreno à data da DUP era desprovido de capacidade edificativa, não podem os expropriados pretender indemnização correspondente a um solo apto para construção».
Assim só não aconteceria se os ora recorrentes/expropriados lograssem demonstrar que haviam adquirido a parcela de que tratam os presentes autos antes de a mesma ser integrada em Reserva Agrícola Nacional e em Reserva Ecológica Nacional, situação essa em que seria de aplicar o disposto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações de 1999, exatamente no sentido preconizado pelo Ac. do TC n.º 469/2007, de 25 de Setembro, que julgou inconstitucional, por violação do artigo 13.º da Constituição, a interpretação, feita no Acórdão deste Supremo Tribunal de 20 de Março de 2006, dos artigos 23.º, n.º 1, 25.º, n.os 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º do CE de 1999 e determinou a sua reformulação em conformidade.

(…)

No caso em apreço tal situação não ocorre, pois, como refere o Acórdão da Relação, ora em recurso, «na hipótese em apreço nestes autos devemos concluir que não se verifica esse requisito essencial à aplicação do artigo 26.º, n.º 12, na medida em que sabemos que o PDM de Matosinhos foi publicado em 1992 e o prédio apenas foi registado a favor dos expropriados em Maio de 2002”.

Esclarecedor …

Gostaríamos também de reforçar a importância do Acórdão n.º 641/2013 de 11 de novembro do Tribunal Constitucional quando é pedida “a apreciação e a declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma constante do n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de setembro, alterado e republicado pela última vez pela Lei n.º 56/2008, de 4 de setembro, quando interpretada no sentido de ser indemnizável como solo apto para construção, terreno integrado na Reserva Agrícola Nacional (RAN) com aptidão edificativa segundo os elementos objetivos definidos no n.º 2 do artigo 25.º do mesmo Código” e cuja decisão foi não declarar inconstitucional.


Este Acórdão é de leitura obrigatória porquanto vinca, na nossa modesta opinião, as condições em que deve ser considerada a indemnização tendo por base o n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações.  

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