Os órfãos do Decreto-Lei 329-A/2000, de 22 de dezembro

(Artigo em Out Of The Box, a quem agradecemos a permissão para publicação)
 
 
(Sou, desde há alguns anos, um leitor atento do Out Of The Box. Foi com surpresa que recebi o convite de Gonçalo Nascimento Rodrigues para pertencer à lista de “Associate Thinker”. Foi também com orgulho, pois todos nós gostamos de estar junto dos melhores!).

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O Out of the Box define-se como “um portal português de Finanças Imobiliárias” e um “centro de partilha de conhecimento e informação sobre o mercado imobiliário e financeiro”. Não é de estranhar que os conteúdos sobre avaliação partilhados reflitam, de algum modo, este seu posicionamento.

No entanto, a avaliação de imóveis, assunto sobre o que me proponho escrever, é muito mais abrangente. Existem muitas particularidades na profissão de Perito Avaliador de Imóveis que são desconhecidas e que têm um impacto decisivo na vida das pessoas. A minha missão como contribuinte do blogue será cumprida se eu conseguir, ao longo dos meus artigos, partilhar algumas dessas particularidades.

Assim sendo, proponho-me começar comentando as consequências da revogação do Decreto-Lei 329-A/2000, de 22 de dezembro.

A lei do regime de arrendamento urbano de 1990 instituía para o arrendamento habitacional diversos regimes, entre os quais se destacaria o regime de renda condicionada.

Cairiam neste regime todos os contratos por livre iniciativa entre as partes, os fogos construídos para fins habitacionais pelo Estado ou pelos seus organismos subsidiários, os fogos construídos por cooperativas de habitação económica, associações de moradores, cooperativas de habitação-construção que, de alguma forma, tivessem recebido, direta ou indiretamente, subsídios do Estado.

Neste regime, o valor máximo das rendas não podia exceder o duodécimo do produto resultante da aplicação da taxa das rendas, fixada por portaria governamental, pelo valor atualizado do fogo.

É curioso verificar que esta legislação, do ano de 1990, já mencionava um Código de Avaliações que nunca veio a ser publicado, sendo previsto um regime transitório que se tornou definitivo até entrar em vigor a atual lei do arrendamento habitacional.

Para o cálculo do valor atualizado do solo, explicado no Decreto-Lei 329-A/2000, de 22 de dezembro, o Governo fixava todos os anos, no mês de outubro, para vigorar no ano seguinte, os preços de construção de habitação por metro quadrado.

O país era ainda dividido em três zonas e a cada uma delas correspondia um preço de construção por m2.

A revogação de Decreto-Lei 329-A/2000, de 22 de dezembro, e da divulgação dos preços de construção de habitação veio criar dificuldades a entidades que o utilizavam como referência. Essas entidades eram: 
  • As companhias de seguro, para efeitos de determinação e fixação do capital a garantir no âmbito de vários contratos de seguros, nomeadamente no contrato de seguros de multirriscos de habitação. Estas utilizavam os valores fixados como referência e, a partir deles, extrapolavam para outros tipos de imóvel, que não os de habitação. Por exemplo, costumavam aplicar as seguintes percentagens sobre o valor da portaria:
    • Escritórios – 60%;
    • Pavilhões Industriais – 50%;
    • Garagens – 40%;
    • Zonas Comuns – 30%;
  • Os Tribunais, no âmbito da aplicação do Código das Expropriações. Este código utilizava, supostamente a título meramente indicativo (mas que era utilizado quase sempre!), os montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.

Durante muitos anos, os cidadãos foram prejudicados, porque indemnizações que deveriam aproximar-se do valor de mercado eram estimadas através de legislação fixada administrativamente. 

Confirmado que foi o desaparecimento do Decreto-Lei 329-A/2000, de 22 de dezembro, em novembro de 2014, como resolveram estas entidades o problema?

Seria importante que os poderes públicos prestassem atenção a esta orfandade. 

Será que continuam a aplicar legislação já revogada para sustentar as decisões que tomam?

Finalmente, o Código das Avaliações nunca viu a luz do dia. Não seria de ponderar estender a lei 153/2015 para a avaliação de qualquer imóvel e para qualquer tipo de avaliação que se realize em Portugal?

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