O "justo valor" não é o "valor de mercado"?!
Voltamos à revista TOC
111 de Junho 2009, da, na altura, Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, e ao quadro que a seguir reproduzimos:
Mereceu-nos uma reflexão
o aspeto particular evidenciado de entender o “justo valor” como o “valor
realizável liquido”, que, em tese, corresponderia ao “valor de mercado”.
A nossa opinião,
modestamente, é que esta consideração é um pouco redutora do que pode ser
considerado como “justo valor”, sobrepondo este conceito ao conceito de “valor
de mercado”.
Tentaremos demonstrar ao
longo deste artigo que o “valor de mercado” não corresponde, exatamente, ao
“justo valor”.
De acordo com o normativo
contabilístico, nomeadamente a NCRF 7, devemos considerar “justo valor: é a
quantia pela qual um ativo pode ser trocado ou um passivo liquidado, entre
partes conhecedoras e dispostas a isso, numa transação em que não exista
relacionamento entre elas”.
Mais adiante, a mesma
norma refere que “O justo valor de terrenos e edifícios deve ser determinado a partir de provas com base no
mercado por avaliação que deverá
ser realizada por avaliadores profissionalmente qualificados e independentes. O
justo valor de instalações e equipamentos é geralmente o seu valor de mercado determinado dor avaliação” e também que
“Se não houver provas com base no mercado do justo valor devido à natureza especializada do item do ativo
fixo tangível ou se o item for
raramente vendido, exceto como parte de um negócio em
continuação, uma entidade não deve utilizar o método de revalorização”.
Por valor de mercado, na
avaliação de património, entendemos como o “valor pelo qual um bem pode ser
transacionado, num mercado livre e competitivo e após um determinado período de
tempo razoável, em que os intervenientes atuem de livre vontade, sem qualquer
interesse particular e conhecedores de toda a informação relevante”.
Talvez com um exemplo
possamos explicar melhor a diferença, em nossa opinião, entre “justo valor” e “valor
de mercado”:
Exemplo:
As instalações de uma
empresa (ativo fixo tangível) estão preparadas para a industria de curtumes e
são causadoras de um impacto ambiental negativo na sua envolvente. No entanto,
tem todas as licenças e autorizações devidas para o seu funcionamento, pelo que
se encontra absolutamente legal. A administração da empresa já sabe que, caso
termine a sua atividade, o local onde está instalada deve reconvertido para
zona verde, de acordo com o Plano Diretor Municipal, com uma densidade de
construção quase residual. O valor estimado para este uso alternativo é de
200.000€ (valor realizável liquido).
É este o valor pelo
que deverão ser registadas, na contabilidade, as instalações da empresa
(terreno e imóvel)?
Pela análise de
revista TOC 111 de Junho
2009,
sim, pois este seria o valor realizável liquido. A nossa posição é discordante.
Teoricamente não
poderíamos utilizar a noção de “justo valor”, pois tal não é permitido para
ativos especializados ou raramente vendidos, o que é o caso. Só que o
legislador abre uma exceção para negócios em continuação. E a partir daqui só
exige que seja determinado a partir de provas com base no mercado. Assim sendo,
o “justo valor” é estimado tendo em conta a noção de “valor de mercado em uso
continuado”.
O valor do ativo fixo
tangível será então estimado como o valor que teria se fosse construído de
novo, com os mesmos materiais e sujeito aos efeitos de vetustez visíveis à data
de avaliação, que depreciará o seu valor (método do custo depreciado). Ao valor
agregado dos custos de construção e do terreno (obtido no mercado), adicionando
a margem de lucro do promotor (de mercado) obtemos o “valor de mercado em uso
continuado”.
Desta forma, a norma é
integralmente cumprida. Em termos abstratos, o “valor de mercado” pode ser
200.000€ e o “valor de mercado em uso continuado” (que vai ser registado na
contabilidade) de 1.000.000€.
Esta ambiguidade pode
ser penalizadora para a Banca, quando obtém garantias reais sobre este tipo de
imóveis. De facto, o perito avaliador deve avaliar em “uso continuado”,
induzindo a Banca para valores que nunca realizará se, porventura, o negócio
for liquidado.
Poderá ser esta a
razão por que a Banca, salvo uma ou duas raras e honrosas exceções, é tão pouco
transparente na hora de divulgar as avaliações que realiza. É que o cliente
bancário, pagando as avaliações, raramente as vê!
Justo valor, pode ou não ser o valor de mercado. Conforme refere a norma NCRF 7, devemos considerar “justo valor: é a quantia pela qual um ativo pode ser trocado ou um passivo liquidado, entre partes conhecedoras e dispostas a isso, numa transação em que não exista relacionamento entre elas”. Isto é que é o justo valor!!! Todas as outras hipoteses de cálculo de um valor, para um determinado ativo, é apenas e tão somente isso mesmo, uma forma diferente de identificar esse valor. Determinados ativos não têm um mercado onde se façam transacções, e neste caso alguns estudos,apenas nos podem dar uma noção para esse valor. A forma correcta para se aferirem os justos valores,é a analise dos fluxos financeiros gerados por esses activos, e é este valor, que normalmente deve ser considerado por justo valor, e não outro.
ResponderEliminar…"O justo valor representa o preço acordado de forma razoável entre duas partes específicas para a transacção de um activo. Mesmo que as partes não tenham qualquer relação entre si e negoceiem de forma independente, o activo não é necessariamente exposto no mercado e o preço acordado pode reflectir as vantagens (ou desvantagens) específicas da sua detenção para as partes envolvidas e não para o mercado em geral…” -Red Book - RICS
ResponderEliminar“…O Justo Valor exige a estimativa do preço justo entre duas partes específicas considerando as respectivas vantagens e desvantagens decorrentes da transacção para cada uma das partes. “…” -Red Book – RICS
A grande diferença entre Valor de Mercado e Justo Valor surge no facto da propriedade não ser obrigatoriamente exposta no mercado livre e concorrencial por tempo considerado razoável e, nele – Justo valor – poderem vir refletidas vantagens/desvantagens decorrentes da transação/negociação. Trata-se então de um Acordo entre partes livres e conhecedoras (que conhecem o mercado) mas que nesse acordo poderão estar envolvidos “…determinados aspectos que não foram tidos em conta na estimativa de Valor de Mercado” - Red Book – RICS
Quando estes pressupostos acontecem estamos perante o Justo Valor para as partes mas não perante um Valor de Mercado pois, na realidade, o bem, poderá nem sequer ter sido colocado no mercado e/ou não foram garantidos os pressupostos de independência necessários na própria definição do Valor de Mercado. Não existe o termo “Valor de mercado para as partes” existe sim Valor de Mercado em sentido lato.
O termo -Justo- poderá aqui (pelo menos em Português!) ser entendido não no sentido de -justiça- mas no sentido de ter sido feito à medida (“coube que nem uma luva” – expressão popular) para aquelas partes, sendo contudo salvaguardados outros pressupostos tais como o não relacionamento das partes e que os intervenientes são conhecedores do mercado. Estes pressupostos são fundamentais e comprovam o grande paralelismo entre definições (Justo valor e Valor de mercado) sem contudo o serem realmente.
“Entre os exemplos existentes de justo valor figuram o preço acordado entre um senhorio e um arrendatário pela concessão ou prorrogação de um contrato de arrendamento, ou o preço pela transferência de acções numa empresa privada. “ Red Book – RICS
Não obstante, segundo as normas contabilísticas o Justo valor ali retratado é normalmente equivalente ao Valor de Mercado.
Dora Cruz
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarReconheço a correção da análise inicial, nomeadamente no que se refere à questão do valor em mercado livre e em uso continuado. Contudo, julgo que na transposição valor de mercado/justo valor há que ter em conta os eventuais custos de transação de forma a que este último valor seja próximo ao líquido realizável. No que concerne à banca, seria preferível que o custo de avaliação estivesse englobado nos custos de análise para terminar com a questão do acesso do cliente ao relatório final. Não me parece razoável, como já me aconteceu, ter que discutir tecnicamente uma avaliação com um cliente. Quanto ao valor a considerar para efeitos de decisão de operações de crédito, utilizando o exemplo do artigo, o banco deve ter em consideração o valor de mercado por ser aquele que espera recuperar se vier a adquirir o imóvel na eventualidade de incumprimento, definindo o LTV admissível para aquele colateral com base nos 200k. A finalidade de um colateral é a de garantir que em caso de financeira, o risco de perda esperada próprio dessa operação seja mitigado.
ResponderEliminarAgradeço, antes de tudo, a lucidez do seu comentário.
EliminarDiscordo somente quando diz "Não me parece razoável, como já me aconteceu, ter que discutir tecnicamente uma avaliação com um cliente". O que diz só tem sentido, em minha opinião, quando a entidade bancária está a negociar a concessão de crédito. O mesmo já não será válido quando se discute dações em pagamento ou reforços de garantias, por exemplo. A transparência obrigará a que o cliente, assessorado com profissionais da avaliação, possa ter acesso às avaliações.
concordo, referia-me somente ao processo de análise e decisão de operações de crédito. As negociações no âmbito de processos de recuperação de crédito, nomeadamente as facões
ResponderEliminarQuando é que estamos perante uma perda de imparidade?
ResponderEliminarEstamos perante uma imparidade quando o valor pelo qual um imóvel está valorizado no balanço da empresa é superior ao seu valor de mercado.
Eliminar