VPS 2 no processo de avaliação: bases de valor, pressupostos e pressupostos especiais
No âmbito das normas RICS, em particular do Red Book Global Standards, a
norma VPS 2 (Valuation Technical and Performance Standard 2) constitui um dos
pilares fundamentais do processo de avaliação. Esta norma, sob o título “Bases
of Value, Assumptions and Special Assumptions”, define o enquadramento
conceptual da avaliação, estabelecendo com clareza qual é o tipo de valor a
determinar, sob que condições e com que pressupostos.
Com a entrada em vigor da versão de 2025 do Red Book, a antiga VPS 4 passou
a ser identificada como VPS 2, numa reorganização que pretendeu reforçar a
lógica sequencial do processo de avaliação. Esta alteração não é meramente
formal. Ela reflete uma visão mais estruturada da prática da avaliação, em que
a definição da base de valor deve suceder diretamente à formalização dos termos
de contratação (VPS 1), garantindo coerência desde o início da prestação de
serviços.
A base de valor como elemento estruturante
A base de valor é o ponto de partida de qualquer avaliação. Segundo as IVS
(International Valuation Standards), a sua definição é obrigatória e deve ser
adequada ao propósito da avaliação, compreensível para o cliente, justificada
tecnicamente pelo perito avaliador de imóveis certificado e compatível com os princípios fundamentais
das IVS.
É essa base que orienta todo o processo subsequente — desde a escolha do
método de avaliação, até à seleção e interpretação dos dados de mercado. Ela
determina, por exemplo, se a avaliação se deve basear em rendas efetivas ou
rendas de mercado, se o ativo é considerado numa ótica de utilizador genérico
ou de um investidor específico, e até se os custos de transação devem ou não
ser tidos em conta.
Entre as bases de valor mais utilizadas destacam-se:
-Valor de mercado: É, por larga
margem, a base mais comum. A sua definição, segundo as IVS, é clara:
“O valor de mercado é o montante estimado pelo qual um ativo ou passivo
deve ser transacionado, na data da avaliação, entre um comprador interessado e
um vendedor interessado, numa transação em condições normais de mercado, após
adequada promoção comercial, em que ambas as partes atuam de forma informada,
prudente e sem coação.”
-Valor de investimento: Trata-se do
valor do ativo para um investidor específico, tendo em conta os seus objetivos
particulares. Pode refletir sinergias, economias fiscais ou outras vantagens
estratégicas, e por isso não coincide necessariamente com o valor de mercado.
-Justo valor (fair value) – Muito utilizado em contexto contabilístico, é
definido como:
“O preço que seria recebido pela venda de um ativo ou pago pela
transferência de um passivo numa transação ordenada entre participantes no
mercado na data da mensuração.”
É uma base comum nas IFRS, semelhante ao valor de mercado, mas com nuances
próprias, nomeadamente quanto à identificação dos participantes do mercado e à
consideração dos custos de transação.
A novidade de 2025: custos de transação
A versão de 2025 da VPS 2 introduziu uma importante clarificação sobre os
custos de transação, matéria frequentemente mal compreendida e que causava
divergências nas práticas avaliativas.
A norma agora especifica que, nas avaliações baseadas em valor de mercado
ou justo valor (IFRS), o valor reportado deve refletir o preço acordado entre
participantes no mercado antes de qualquer consideração relativa a custos de
aquisição ou alienação. Em outras palavras, trata-se do preço bruto da
transação.
Assim, o avaliador não deve deduzir comissões de mediação, impostos, taxas
de escritura ou registos ao valor estimado. Da mesma forma, não deve adicionar
custos de obras, remodelações ou qualquer outro encargo que, embora previsível,
não integre o valor de mercado tal como definido pelas IVS.
Esta clarificação promove a comparabilidade entre avaliações e reforça o
alinhamento com normas contabilísticas e regulatórias internacionais. Se, por
razões de conveniência, o cliente desejar conhecer o impacto financeiro total
da transação, essa informação pode e deve ser fornecida, mas separadamente do
valor de avaliação.
Pressupostos e pressupostos especiais: limites e hipóteses
Outro elemento central da VPS 2 é o tratamento dos pressupostos e dos
pressupostos especiais, que são condições consideradas válidas pelo avaliador
para efeitos da avaliação.
Os pressupostos são, essencialmente, suposições feitas para colmatar a
ausência de verificação direta. São admissíveis quando:
-São relevantes para o tipo de avaliação;
-Estão claramente especificados;
-Refletem os limites do trabalho realizado.
É essencial que estes pressupostos sejam comunicados ao cliente e
devidamente justificados.
Já os pressupostos especiais referem-se a condições hipotéticas, que não
existem na data da avaliação, mas que são consideradas como se existissem. Têm
aplicação, por exemplo, na avaliação de imóveis após obras, de terrenos com PIP
aprovado ou de ativos em cenários futuros plausíveis.
É fundamental que estas suposições não sejam arbitrárias. Devem basear-se
em fundamentos técnicos, legais ou administrativos que tornem plausível o
cenário projetado. Cenários irrealistas descredibilizam o relatório e podem ter
consequências legais.
Boas práticas e erros a evitar
A aplicação correta da VPS 2 exige não apenas domínio técnico, mas também
disciplina profissional. A ausência de definição da base de valor, ou a escolha
incorreta da mesma, é uma das falhas mais comuns. Sem essa definição clara, a
avaliação perde sentido, pois deixa de estar ancorada num objetivo específico.
Também é frequente o uso de pressupostos copiados de modelos padrão, sem
adaptação ao caso concreto. Isto pode induzir o cliente em erro, comprometer a
qualidade técnica do relatório e gerar responsabilidade legal.
Outro erro recorrente está relacionado com a omissão de pressupostos que
condicionaram a avaliação. Por exemplo, se o avaliador assume que o imóvel tem
licença de utilização, mas não verifica esse facto, esse pressuposto deve ser
declarado. A sua omissão representa uma falha de transparência.
Finalmente, uma desconexão entre o vínculo contratual (VPS 1) e o conteúdo
efetivo do relatório constitui uma violação grave, tanto da VPS 2 como da
integridade profissional do avaliador. O relatório deve refletir de forma
rigorosa os termos acordados com o cliente e as limitações do trabalho realizado.

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